Foto: SCDH. Curso “Direitos Humanos e Atendimento Humanizado às Pessoas em Situação de Rua”, realizado pela Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos (SECDH)para os guardas municipais de Belém.
Por Max Costa*
Tenho a honra de ter sido o primeiro secretário de Cidadania e Direitos Humanos de Belém, nomeado de forma extraordinária pelo prefeito Edmilson Rodrigues, que entendeu a necessidade da garantia de direitos fundamentais para a dignidade humana e criou este importante órgão no município.
Com uma equipe competente, talento profissional e compromisso militante na defesa dos direitos humanos, conseguimos criar e estruturar uma política municipal, com estabelecimento de diretrizes e programas e atendimento direto a pessoas vítimas de violações de direitos humanos, mesmo com todos os ataques conservadores e o fato de, nacionalmente, ainda não termos uma política estruturada com metas efetivas, parâmetros de direcionamento único e dotação orçamentária própria, tal qual temos no SUS, no SUAS e no SUSP, por exemplo.
Embora muito do que tenhamos planejado não tenha sido efetivado pelo conjunto da gestão, por uma série de motivações que podemos discutir em outro momento, é importante destacar que a criação da Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos de Belém (SECDH) foi um o fundamental para que possamos avançar na defesa dos direitos humanos de forma universal, integral e interdependente, compreendendo a urgência de termos ações coordenadas e estruturantes de promoção de direitos sociais básicos e de combate ao racismo, à misoginia, à LGBTfobia, ao capacitismo e todas as formas de violência e vilipêndio da dignidade humana.
Mas, surpreendentemente, as ações da nova gestão municipal vão na contramão do acúmulo adquirido pela SECDH até aqui, das resoluções do Conselho Municipal de Direitos Humanos recém retomado e das experiências militantes dos movimentos sociais. Ao que indica pelo projeto de Reforma istrativa a ser encaminhado à Câmara Municipal, para ser apreciado no dia 15 de janeiro, o prefeito Igor Normando pretende promover o apagamento da pauta dos Direitos Humanos, transformando a atual Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos em apenas uma Secretaria Municipal de Cidadania.
Não se trata apenas da exclusão de duas palavras, mas de um aceno à extrema-direita, demonstrando a quem a atual gestão municipal está alinhada. Até porque é um ataque típico de governos conservadores, que deturpam o conceito de direitos humanos e privilegiam ações focalizadas, filantrópicas e assistencialistas, na tentativa de invisibilizar e até exterminar sujeitos detentores de direitos, em especial as pessoas pobres, pretas e periféricas, criminalizadas e vilipendiadas diariamente.
Um retrocesso justamente na única cidade do Estado que possui uma Secretaria Municipal de Direitos Humanos. Uma medida grave na capital do Pará, que é a unidade da federação que lidera rankings de violações de direitos humanos e possui a maior quantidade de lideranças socioambientais e defensores de direitos humanos ameaçados de morte.
Ao promover tal apagamento dos direitos humanos, a gestão municipal da família Barbalho demonstra uma possível sintonia com o bolsonarismo. No discurso, se pintam de progressistas para enganar desavisados, mas na prática copiam ideias bolsonaristas e, de forma autoritária e sem debate algum com a sociedade civil, tentam impor uma reforma istrativa que mistura os ajustes de Paulo Guedes com o conservadorismo de Damares, para atacar a cidadania daqueles e daquelas em situação de risco e vulnerabilidade social.
Trata-se de uma política que deseduca, desinforma e alimenta confusões no imaginário popular sobre o que são os direitos humanos, além de reforçar preconceitos e contribuir para criminalizar defensores e defensoras das garantias básicas para a dignidade humana.
O que se espera do poder público é o inverso. Além de garantir direitos básicos para que as pessoas vivam com dignidade, a gestão tem que cumprir um papel educativo, para que a população seja educada com uma visão de mundo que as possibilite conhecer seus direitos, e tenham condições de estar em um patamar de organização para reivindica-los e garantir sua efetivação.
Porém, compreendo que as opções políticas da atual gestão indicam que este apagamento dos direitos humanos não se trata apenas de um equívoco pontual, mas é um projeto de poder, alinhado às medidas de austeridade e antipovo da velha política paraense, que se sustenta e se reproduz há décadas, a partir da exploração da miséria do povo e da espoliação dos recursos naturais da Amazônia. Aos defensores e defensoras dos direitos humanos na Amazônia, resta fazermos o que sempre fizemos: nos contrapormos, firmemente, a mais esse ataque e fortalecer a luta em defesa da vida, da democracia e dos direitos humanos. Luta que segue e vamos, juntos e juntas, barrar esse retrocesso!
Max Costa é Jornalista, doutorando do NAEA/UFPA e 1° secretário de Cidadania e Direitos Humanos de Belém